domingo, 15 de março de 2009

Os meteorologistas e o clima financeiro

Não deve ser fácil, eu admito, prever como será o tempo na cidade e as respectivas máximas e mínimas do dia e ainda por cima ter que divulgar isso diariamente, enfrentando o humor da mãe-natureza nessa luta inglória. Pelo menos eu tento recordar que o trabalho deles é de previsão do tempo, o que atenua minha crítica quando comprovo o quão errada estava a previsão para um dia qualquer.

Penso que precisamos ser tolerantes com quaisquer situações na vida que envolva as nossas ou as dificuldades das outras pessoas, mas é certo que a primeira deve cessar quando surge o famoso “abuso”. Difícil é delimitar a fronteira entre um e outro, o que não pretendo fazer hoje.

O Dionísio, amigo meu que a cada dia fica mais interessado em assuntos como o que escrevo aqui, tem ficado um tanto irritado ao comprovar como os economistas mundiais têm errado muito quando se decidem por projetar o comportamento econômico de cada país ou de algum indicador mundial.

Eu disse a ele que as projeções são assim mesmo, o camarada que estuda Economia, aprende a projetar um cenário de acordo com as informações disponíveis na atualidade, sendo obviamente muito difícil controlar cada uma das variáveis que compõem uma situação futura. Resolvi dizer ao Dionísio, de acordo com minha humilde opinião, onde estava o verdadeiro erro, o que lhe causou um misto de frustração e desilusão.

Cada um de nós, atores econômicos de menor ou maior porte, encontrou algum conforto na vida financeira ao olhar uma projeção econômica e imaginar onde estaria quando aquele cenário se realizasse, ou melhor, em que situação ficaria naquele momento futuro em que se materializassem tais previsões. Entendo que daí provém nossas frustrações econômicas, talvez até seja também o motivo para frustrações de qualquer espécie.

Não podemos deixar para os demais a construção da imagem de nosso futuro. O Dionísio ou qualquer um de nós pode e deve delegar às pessoas que são capazes de fazê-lo, o trabalho para a construção da base financeira que pretende alcançar, mas não podemos nunca perder de vista o cenário que cada um de nós deve manter atualizado pelas tantas e claras informações que nossa mente capta sobre a realidade de nossa vida e de nosso país, sob risco de cair nas emaranhadas reder da previsão econômica.

Um exemplo claro para ilustrar esse problema que pessoalmente testemunho a mais de 15 anos é ver dois grandes bancos americanos projetarem tão diferentes cenários para o PIB brasileiro em 2009 e 2010.

O Banco Morgan Stanley prevê que este ano nosso PIB vai cair 4,5% e que ainda cairá mais 0,5% no ano que vem. Enquanto isso o Bank of America/ML prevê que o PIB vai crescer apenas 0,8% este ano, voltando a crescer 4,4% no ano que vem. Ainda teríamos algumas dezenas de firmas com diferentes previsões para preencher a lacuna entre os dois acima.

Sabemos então que a previsão é frágil, pois sempre será um exercício de futurologia, com mais ou menos chances de confirmar-se. Então o mais importante é analisar como estamos passando pela situação atual, no caso uma crise épica e centenária que por hora devastou a economia mundial.

Nesse sentido o Dionísio está certo, pois vive me dizendo que um país como o Brasil, que tem a terceira maior fabricante de aeronaves do mundo; tem a segunda maior mineradora do mundo; tem uma empresa de petróleo com tecnologia de ponta e reservas de óleo que farão o país estar entre os oito maiores produtores nos próximos dez anos; um país com um mercado consumidor de quase 200 milhões de pessoas; um território e uma indústria de alimentos que fornece mais comida do que o brasileiro poderia consumir; o único entre os iguais que possui uma taxa de juros ainda muito elevada e que portanto permite uma queda acentuada que estimulará o consumo e a atividade econômica, não pode estar mal preparado para o futuro.

Enfim, como disse em uma entrevista para o Wall Street Journal essa semana Jim O’Neill, o criador do conceito “BRIC”, nome para o grupo de países que segundo o economista da Goldman Sachs irão ser os pilares da economia global em 2050:

O´Neill: “Argumentei durante três anos que não seria possível realmente dizer se Rússia e Brasil justificariam seu status de Bric até que passassem por um períodos de preços de commodities fracos.”

WSJ: Então este é um teste maior para Brasil e Rússia do que para Índia e China?

O´Neill: “Este não é nenhum teste para China e Índia. É decididamente um teste para Rússia e Brasil. E é um bom teste.”

WSJ: Eles passarão?

O´Neill: “Acho que a evidência no Brasil já é sim. A estrutura macroeconômica de melhores práticas que Lula adotou sete anos atrás está demonstrando que o Brasil pode lidar com essa crise. O Brasil dos anos 70 aos 90 estaria tão ruim quanto à Rússia. Não estou certo de que a Rússia possa enfrentá-la e temo que não possa. Até agora, esta crise está demonstrando que a Rússia é dependente demais de commodities.”

WSJ: Quando o Sr. fala sobre o Brasil conseguindo enfrentar, o que quer dizer?

O´Neill: “A moeda enfraqueceu, o mercado acionário enfraqueceu, mas diferentemente de crises brasileiras passadas eles não tiveram de aumentar as taxas de juros para conter a saída de capital, o que é um sinal muito poderoso.” (fim do trecho)

Deixemos as previsões para os economistas que, aliás, são muito bem pagos para fazê-las. Assim como o Dionísio, muitos aprenderam a andar com um guarda-chuva ao sair de casa independente do que a previsão do tempo diz.
Espero que aqui possamos sempre “discutir” e fazer uma avaliação sincera, realista das condições econômicas do presente e das conseqüentes oportunidades que nosso país continuará a apresentar para os que souberem aproveitá-las.

quinta-feira, 5 de março de 2009

O mundo e seus insistentes movimentos pendulares

Nos momentos atuais cada um de nós tem dedicado um pouco mais de atenção aos acontecimentos econômicos mundiais, enquanto ao mesmo tempo nossas mentes têm procurado por respostas sobre quanto essa crise significará de perdas para a economia real e por quanto tempo a teremos por aqui.

Não é de surpreender também que surjam nesses momentos muitas previsões sobre o futuro, sejam de economistas ou de videntes, e especialmente muitos cavaleiros que insistem em serem os arautos do apocalipse. A pergunta que não nos deixa em paz ao acompanhar essa inundação de dados e notícias fica sem resposta enquanto ficarmos apenas analisando os fatos presentes sem a perspectiva das engrenagens que movem o mundo capitalista.

Recordei-me de minha visita à ilha de Cuba há alguns anos atrás e de como achei retrógrada a entrevista da imigração deles, questionando-me se eu tinha algum vínculo político ou ainda que tipo de atividade social eu praticava no Brasil, como se eles ainda estivessem na época da guerra fria. Na verdade, afora a parte triste de existir um lugar como aquele, com pessoas que não têm a perspectiva do que é viver outra vida senão sob o jugo da mão ditatorial, eu entendi ao passar pela imigração que a partir daquele momento eu precisava olhar as coisas sob a lente do entendimento das engrenagens que moviam aquele regime e a vida dos habitantes do lugar. A viagem foi a partir de então, fantástica.

Aconselho uma visita. A parte histórica de Havana parece uma visita às cidades antigas da Europa; a região de Varadero, a praia com muitos hotéis à uma hora de Havana, é linda, com a mesma água azul turquesa que eu vi em Bahamas, mas com a vantagem de uma área enorme de areias brancas; o serviço é muito bom para um lugar que não tem luxos; a comida é muito parecida com a nossa e muito saborosa. Mas aconselho uma visita para antes de o regime ruir, pois depois a ilha vai receber tanto investimento que vai virar um balneário para os norte-americanos, que finalmente vão levar alguma dignidade econômica para os cubanos, embora me preocupe muito se vai sobrar algum charuto cubano para o resto do mundo comprar quando tudo isso acontecer.

Sem querer tirar o prazer da viagem mental que fizemos à ilha de Cuba, trarei nossos pensamentos de volta para o assunto “crise” e aquela pergunta que não quer calar. Por enquanto não posso oferecer mais do uma reflexão sensata sobre as observações que faço diariamente, no caso de hoje, sobre alguns dados interessantes que uma consultoria de Londres publicou essa semana.

Uma das engrenagens que movem o capitalismo é a precificação de um ativo pela lei da oferta e procura. Pelo que temos visto, a oferta de ativos financeiros tem sido maior do que a procura e por isso os preços mantêm-se em baixa, especialmente o petróleo. Recordem que apesar dos esforços feitos, a matriz energética do mundo ainda está casada com o “ouro negro” e assim permanecerá por muitos e muitos anos, especialmente se o preço dessa fonte energética permanecer em patamares acessíveis. O que aconteceu nos últimos cinco anos foi icônico nesse sentido, quando o preço do barril de petróleo explodiu dos 38 dólares por barril em 2004 para os 150 dólares do ano passado.

Tamanha é a importância do preço do petróleo para a economia mundial que mesmo os países que lucram com a exportação desse elemento estavam muito preocupados com o desequilíbrio causado nas contas de indivíduos e governos com tal abuso praticado pelos players do mercado futuro de petróleo, responsáveis por incendiar a tendência real que havia de alta nos preços, reflexo do crescimento mundial pujante que acontecia.

Os números indicam que o mundo gastou em 2008 o equivalente a 4,9% do PIB mundial com petróleo. Sinceramente, esse número sozinho não diz nada, mas se comparado com a projeção dessa mesma consultoria de que em 2009, em consequência dos preços baixos praticados atualmente, esse gasto será de “apenas” 2% da riqueza gerada no mundo inteiro, significa que nós todos em conjunto economizaremos 1,72 trilhões de dólares só nesse item. Não foi levada em conta a economia em cascata que os preços mais baixos dos combustíveis vão causar na cadeia produtiva como um todo, o que certamente vai significar uma poupança adicional.

Esse valor que será poupado por todos nós é equivalente, de acordo com os cálculos feitos pelos mesmos consultores, a quase três vezes os pacotes de incentivos econômicos anunciados para serem “queimados” ainda este ano, no mundo inteiro. É como se uma força oculta declarasse agora um pacote de estímulos desse porte gigantesco, oferecendo sem distinção de raça, credo ou cor (excetuando-se um outro ditador disfarçado de democrata que infesta um país vizinho e produtor de petróleo), uma benesse para todos os agentes econômicos, nós consumidores inclusos. Posso pedir que você releia as linhas acima novamente, por favor? Obrigado.

O quanto esse “pacote” ajudará a economia mundial a voltar a crescer e em que velocidade, está além de minha capacidade como gestor. Mais uma vez deixo essa tarefa para os que lidam com futurologia, coisa que não faço.

As engrenagens do capitalismo continuam a ditar os altos e baixos da economia, fazendo os pêndulos que ditam a intensidade dos movimentos financeiros serem ao mesmo tempo “vilões e mocinhos” de nossa vida econômica.

O que me parece, ao observar esse caso do petróleo, é que como se fosse uma Lei, para cada movimento que gere um desequilíbrio, há uma força de magnitude similar que impele o pêndulo na direção oposta, assim como em todos os demais aspectos da vida em que podemos comprovar isso, oferecendo em cada ponto extremo de seu curso a clara sensação de que exageramos e que não poderemos evitar a correção, que eu meu entender, é sempre bem-vinda.