Estávamos no carro voltando para meu escritório. Eu sentado no banco do passageiro pensava sobre o ocorrido durante a última uma hora. Miss Daisy na verdade estava me conduzindo, pelo menos assim parecia. Na verdade...
A apresentação que fomos assistir foi muito interessante para mim, pois fui ouvir os administradores de uma grande e muito boa empresa, que admiro e sou acionista, sobre os resultados do 3o trimestre de 2008 e especialmente sentir como está o "mood" da turma sobre o cenário futuro e o que eles ouvem dos clientes. Como trunfo levei a apresentação de dois meses atrás para comparar e checar alguns pontos específicos.
Miss Daisy, senhora educada e nobre como é (você não se lembra do filme?) certamente não foi comigo apenas por conta do café-da-manhã que seria servido durante o evento. Foi para assistir, como acionista, sua primeira apresentação de uma empresa para seus investidores, atividade essa que é comum para todas as companhias que tem o capital aberto em Bolsa de Valores. Não se engane, Miss Daisy é empresária, sabe muito bem das coisas, só não conhece tão bem as entranhas do mercado de capitais, mas isso é questão de tempo.
Estrategicamente escolhi para sentarmos, duas cadeiras lá na frente, o que nos brindou com a presença dos palestrantes em nossa mesa enquanto todos desfrutavam do desjejum prévio ao inicio da apresentação. Obviamente comecei a encher o Gerente de R.I. (relação com investidores) de perguntas, o que o deixou sem muita chance de comer (não atrapalhou em nada o meu ritmo com o sanduíche de presunto no pão francês), mas ele foi gentilmente respondendo o que podia até que o Diretor Executivo da empresa também se sentou conosco, fazendo-me desviar a artilharia para o novo e atraente alvo. Recordei-o que estive na apresentação anterior e dos pontos que gostaria de comparar, pois a crise havia criado um abismo entre as duas datas. Cumprindo seu papel de gentil executivo de empresa listada em Bolsa, me respondeu algumas coisas que eu queria ouvir e não respondeu outras que eu não contava mesmo com respostas.
A apresentação fluiu muito bem e em 25 minutos ele abriu a sessão de perguntas e respostas para a qual eu só tinha uma. Ele gostou de ser recordado do assunto e discursou sobre um dos business que havia "esquecido" de comentar na apresentação e que trouxe notícias boas.
Foi interessante chamar a atenção de Miss Daisy para alguns pontos durante a apresentação, e ela mesma ia abrindo um olhão atento para os números astronômicos da empresa que até outro dia ela não conhecia. Todas as linhas do balanço trimestral pareciam douradas de tão bons que eram os números, até eu me impressionei com alguns, de novo. Fomos embora felizes.
Enquanto esperávamos o carro dela (sim, ela dirige, e bem) eu ia acompanhando as reflexões que faziam sua mente se surpreender, mesmo com toda a experiência de vida que ela tem, com essa face do mercado de capitais, a face que podemos chamar de "causal", onde ocorrem todas as transações comerciais, onde se evidenciam as mútuas dependências entre empresas, setores, países e no final, entre as empresas e o mercado financeiro.
Era como se ela estivesse se rendendo à realidade que eu vinha lhe instruindo há muito tempo, mas que como ela mesma diz "demora pra gente entender, é outro mundo". E essa é a impressão que ela teve quando recordou um dos slides da apresentação que mostrava a enormidade que o preço da ação da empresa havia caído este ano, para o qual exclamou: "Como é possível que essa empresa tenha suas ações negociadas com essa queda toda?"
O que exigiu mais uma vez a resposta que ela não aguenta mais ouvir de mim:
"O preço de uma ação em Bolsa representa apenas o preço para a liquidez daquele ativo com liquidação financeira em três dias, muitas vezes não estando ligado ao valor proporcional que cabe àquela fatia sobre o valor real da empresa, seja pelo seu fluxo de caixa futuro ou até mesmo pelo valor patrimonial vigente."
Quem entende isso, e ela entendeu faz tempo, compreende porque uma ação negociada em Bolsa pode ter seu preço variando 10% para cada lado em dois dias de pregão. Nunca viu ninguém desesperado, precisando de dinheiro vendendo algo?
Hummmm, você acha que essa explicação não justifica a volatilidade? Então encontra um comprador para sua casa que aceite fechar negócio nos próximos vinte segundos com garantia de lhe entregar o dinheiro daqui a três dias. Se encontrar nessas condições, e imagine o preço que seria a oferta, não vende pra ele não, eu pago um mil reais a mais, vende pra mim!
sexta-feira, 7 de novembro de 2008
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Um comentário:
muito bom ronny, certamente o fato de esccrever o blog faz com que a observação esteja muito atenta e isto nos faz captar nuances muito interessantes. valeu!!!
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