quarta-feira, 22 de julho de 2009

Dom Quixote, Belarofonte e a Quimera

Nada como um dia depois do outro, ou meses...



Antes de continuar e propor novas reflexões à sua mente permita-me manifestar que a ausência de novas postagens nesse período ocorreu por conta de dois motivos, ambos importantes para a compreensão do que vem a seguir.



Um dos motivos, mas que não seria por si só suficiente para minha ausência foi o de precisar me dedicar à criação do site institucional da empresa da qual sou responsável pela gestão de recursos, a Blue Compass Capital, que exigiu muitas horas e dias de trabalho de todos os envolvidos, mas que pela repercussão, valeu cada minuto de dedicação minha e do meu sócio para criar a idéia central e os textos, e da empresa de design que aportou a belíssima parte gráfica. Finda a tarefa, tenho mais tempo para retomar o blog. Porém...



A razão superior para minha ausência responde ao mesmo motivo da criação deste blog em 24 de Outubro de 2008. O quê, a data não lhe diz nada? Vou refrescar nossa memória com a citação de uma notícia da "Agência Estado" naquela mesma data, às 18h55 daquela animada tarde:



“Ibovespa cai 6,91% e acumula perda de 50% no ano



PAULA LAIERA - Bovespa voltou a ser fortemente afetada hoje pela significativa deterioração dos mercados financeiros globais, em meio a uma nova onda de apreensão com o rumo da economia mundial. Diante do forte processo de desmonte de posições ao redor do mundo, as ações brasileiras não escaparam das vendas.



O Ibovespa encerrou o dia em queda de 6,91%, aos 31.481,55 pontos - o menor patamar desde o fechamento do dia 25 de novembro de 2005 (31.357,55). Durante o dia, oscilou da mínima de 30.788 pontos (-8,96%) à máxima de 33.809 pontos (-0,03%). O volume financeiro totalizou R$ 4,472 bilhões. Na semana, o Ibovespa acumulou uma perda de 13,50%. No mês, a queda alcança 36,45% e, no ano, 50,72%.



No aniversário de 79 anos da Quinta-feira Negra que marcou o início da fissura que engoliria Wall Street em 1929, os mercados internacionais tiveram um dia de perdas. Na Ásia, todas as bolsas regionais fecharam no território negativo. A de Tóquio caiu 9,6%, para o seu menor nível desde abril de 2003. Na Europa, a Bolsa de Londres caiu 5%, refletindo a notícia de que o Produto Interno Bruto (PIB) do Reino Unido caiu 0,5% no terceiro trimestre - a primeira contração desde a registrada no segundo trimestre de 1992.



Em Wall Street, pela primeira vez em pelo menos cinco anos, os índices futuros de ações tiveram suas operações interrompidas após atingirem o limite diário de queda. A paralisação ocorreu logo cedo, por volta das 8 horas (de Brasília), com o Nasdaq em baixa de 6,76% e o S&P-500 em queda de 6,56%. O Dow Jones futuro foi congelado em queda de 6,3%."
FIM DA NOTÍCIA


Pois é, fico imaginando como ficou sua expressão facial ao ler a notícia acima, deve ter ficado igual a minha, pois ninguém fica neutro diante da descrição do horror pelo qual passavam os mercados financeiros naquele dia.



Enquanto o telefone tocava o dia todo com inúmeras chamadas grávidas de temor e horror, fiquei, em alguns momentos, tentado a ceder aos pensamentos que queriam me arrastar para o "bloco do desespero", que a aquela altura já estava com milhões de foliões atrás do trio elétrico.



Olhei para o céu e só via nuvens cinzas, quase pretas carregadas de energia, castigando com raios e trovões aqueles que insistiam em seguir seu rumo. Quando olhei para o mar (no sentido figurado, pois o único mar que tenho perto do escritório é a MARginal do Rio Pinheiros), as ondas eram tão grandes que davam a impressão de que em breve iriam engolir a valente embarcação que eu comandava.



Recordo de vir à mente a imagem daquele barco pesqueiro no filme "Tempestade Perfeita", e cheguei a me ver naufragando como aquele. Mas por algo fomos dotados de uma mente e da consequente capacidade de refletir, julgar, observar, pensar, e então criar pensamentos que possam opôr-se frente aos que em muitos momentos de nosso dia-a-dia procuram devastar o campo mental. Ainda que não seja motivo dessa postagem, esse "por algo" me permitiu retornar ao conhecimento adquirido durante tantos anos de vida e de mercado financeiro. Então meu estado mental mudou, e ainda que o mercado não tivesse mudado naquele dia, eu tive a certeza que o Norte que me guiava era mais real do que todos os pensamentos de pânico que naquele dia ceifavam muitas mentes e corações ao redor do mundo.



Eis então revelado o leitmotiv (do alemão: motivo condutor) para minha vontade de escrever meus pensamentos aqui, especialmente na noite da sexta-feira sangrenta, como aquele dia ficou conhecido.



Senti-me compelido a apresentar aos amigos e conhecidos, os pensamentos que pela forte lógica que possuíam, poderiam ajudar muitos dos que passavam pelas mesmas lutas que eu. E assim foi que escrevi intensamente por muitas semanas, recordando aos leitores sobre o que estava além da superfície dos fatos materiais e psicológicos do mercado financeiro, ainda que perante o que o noticiário insistia em proclamar, eu parecesse mais com o Dom Quixote em sua tola luta contra o moinho de vento. Mas...



Aprendi também, e guardo muita gratidão por quem me ensinou, que as grandes ondas e as tempestades SEMPRE passam, e que os bons navegantes sabem confiar no Norte indicado por seus conhecimentos. Foi com essa convicção que naveguei por todos aqueles meses de desesperança. Foi com esse conhecimento que transformei para meus clientes, o caos em uma oportunidade, e ainda acabei realizando um bom registro histórico sobre o que passamos nesse período. Não foi fácil escrever aquilo tudo enquanto a grande maioria corria para o outro lado.



No final, finda a parte aguda da crise, tendo sido evitado o pior e estando o mundo no caminho para a reconstrução pós Tsunami, sinto que fiz o que estava ao meu alcance, e que pelas sinceras manifestações que recebi, fico feliz em me sentir menos Dom Quixote e mais com Belarofonte tendo vencido a Quimera.



Hora de regular a mira para outros aspectos mais comuns ao dia-a-dia de um mercado ordenado (nem tanto ainda), e farei o possível para continuar a colaborar com os amigos leitores no que diz respeito às necessidades de cada um em planejar seus investimentos frente à nova realidade de mercado.

terça-feira, 14 de abril de 2009

Everlasting Globstopper

Engraçado como as experiências que a vida nos permite planejar, ou ainda, as que não planejamos, mas mesmo assim podem tornar-se um bom campo experimental para nossas reflexões, acabam por ser um tipo de “Everlasting Gobstopper” (ou você não se lembra daquela bala colorida que a pessoa colocava na boca e que nunca acabava, criada pelo sensacional Willy Wonka? Não, então "clica"no título dessa postagem pra você refrescar sua memória). Tudo bem se você não tem idéia do que estou falando, o importante é que você se identifique com essa sensação de aprendizado constante, de preferência quando tomamos gosto pela matéria ensinada.

A matéria em questão é o mercado financeiro em suas evoluções ao longo do tempo, nossa colocação frente a essa realidade e as novas lições aprendidas. Uma ressalva que faço por ter sido necessário incorporá-la à vida para poder seguir aprendendo, é de ter a humildade sincera de quem acredita que sempre pode aprender algo mais.

Pensei muito nas últimas semanas antes de escrever essa postagem, mas penso que a hora é propícia por poder contar, no caso dos leitores/investidores, com as mentes já liberadas dos pensamentos de terror que tivemos que enfrentar bravamente nos últimos 12 meses (ou quase isso).

Se formos reler as postagens anteriores poderíamos construir um gráfico e acompanhar o comportamento do mercado pelo tom das várias conversas que tive com clientes, amigos e pessoas que trabalham nessa área. Tenho certeza que seria um gráfico muito similar ao que o índice da Bolsa de SP realizou.

Essa observação por si só deve ser suficiente para nossas reflexões considerarem o quanto ainda somos subjugados pelos pensamentos, ainda que nossa vontade lute contra essa influência. Também será vital considerar que o mercado financeiro é uma representação cabal e fidedigna do mundo mental que nos interpenetra em todos os campos da vida. Muitos fazem novelas ou escrevem livros a esse respeito, nós não precisamos ir além daqui para comprovar isso.

Como gestor de recursos, especializado em gestão de ativos de renda-variável, sou chamado a opinar sempre sobre o futuro, seja um minuto, um dia ou um ano. É claro que “previsão” é apenas o que o próprio substantivo sugere, mas como muitos querem ganhos fáceis e de preferência rápidos, surgem ouvidos para qualquer tipo delas, e ganham especial atenção aquelas que sugerem um cenário em linha com o que a mente de cada um projetou.

Não apenas pelas postagens em que relatei muitas dessas “consultas”, mas especialmente pelos extraordinários últimos doze meses que vivemos, você pode imaginar que passei por um período de intensa atividade profissional, além de ter sido a primeira vez em que tive que rever em um período tão curto, cada um dos meus conhecimentos financeiros e colocá-los mais uma vez sob a lupa da razão, afim de que eu pudesse contar com a segurança de estar navegando com a ajuda de instrumentos precisos e rigorosamente imantados ao “Norte” que tem me guiado em todos esses anos.

Já falei em outras ocasiões sobre esse Norte, sobre os instrumentos que utilizo para seguir meu rumo e qual tipo de navegação tenho feito. Penso que nesse momento vale a pena reler duas postagens, na verdade a parte I e II de um pensamento que contempla os conceitos que reafirmo
acima.

O bom de escrever e publicar a própria opinião é que além de exercitar a capacidade de criar novos pensamentos, é possível afirmar que em certa altura meu pensamento era tal ou qual, ainda que me reserve o direito, inalienável a cada ser humano, de ir superando minha compreensão sobre todos os aspectos da vida, para o qual recordo o leitor que não se assuste se for observando essa feliz realidade ao longo do tempo em que me acompanha aqui no Blog.

Considero então que nós já passamos pelo pior da crise financeira, não excluindo a alta volatilidade que ainda veremos perpetuar-se no mercado por um bom tempo. Por entender assim, é hora de avaliar o que vivemos nesse período e ver se há alguma nova lição para aprender, ainda que o mercado não tenha voltado aos preços pré-crise.

O panorama que devemos analisar é o seguinte:


O gráfico mostra 12 meses findos hoje, 14 de abril de 2009.

E agora, caros leitores, eu posso pedir para que cada um faça um exercício de reflexão com esse gráfico, levando em conta o que cada um tem aprendido nesse mundo financeiro e delinear algumas das lições dadas nessa aula que ainda nem terminou?

Obviamente que o melhor é se cada um de nós fizer esse movimento mental, para que possamos unir os pontos e aprender, juntos. Se lhe parece bem, volto em alguns dias com as minhas observações. Você, clique no botão "X comentários" abaixo e registre, por favor, sua opinião.

domingo, 15 de março de 2009

Os meteorologistas e o clima financeiro

Não deve ser fácil, eu admito, prever como será o tempo na cidade e as respectivas máximas e mínimas do dia e ainda por cima ter que divulgar isso diariamente, enfrentando o humor da mãe-natureza nessa luta inglória. Pelo menos eu tento recordar que o trabalho deles é de previsão do tempo, o que atenua minha crítica quando comprovo o quão errada estava a previsão para um dia qualquer.

Penso que precisamos ser tolerantes com quaisquer situações na vida que envolva as nossas ou as dificuldades das outras pessoas, mas é certo que a primeira deve cessar quando surge o famoso “abuso”. Difícil é delimitar a fronteira entre um e outro, o que não pretendo fazer hoje.

O Dionísio, amigo meu que a cada dia fica mais interessado em assuntos como o que escrevo aqui, tem ficado um tanto irritado ao comprovar como os economistas mundiais têm errado muito quando se decidem por projetar o comportamento econômico de cada país ou de algum indicador mundial.

Eu disse a ele que as projeções são assim mesmo, o camarada que estuda Economia, aprende a projetar um cenário de acordo com as informações disponíveis na atualidade, sendo obviamente muito difícil controlar cada uma das variáveis que compõem uma situação futura. Resolvi dizer ao Dionísio, de acordo com minha humilde opinião, onde estava o verdadeiro erro, o que lhe causou um misto de frustração e desilusão.

Cada um de nós, atores econômicos de menor ou maior porte, encontrou algum conforto na vida financeira ao olhar uma projeção econômica e imaginar onde estaria quando aquele cenário se realizasse, ou melhor, em que situação ficaria naquele momento futuro em que se materializassem tais previsões. Entendo que daí provém nossas frustrações econômicas, talvez até seja também o motivo para frustrações de qualquer espécie.

Não podemos deixar para os demais a construção da imagem de nosso futuro. O Dionísio ou qualquer um de nós pode e deve delegar às pessoas que são capazes de fazê-lo, o trabalho para a construção da base financeira que pretende alcançar, mas não podemos nunca perder de vista o cenário que cada um de nós deve manter atualizado pelas tantas e claras informações que nossa mente capta sobre a realidade de nossa vida e de nosso país, sob risco de cair nas emaranhadas reder da previsão econômica.

Um exemplo claro para ilustrar esse problema que pessoalmente testemunho a mais de 15 anos é ver dois grandes bancos americanos projetarem tão diferentes cenários para o PIB brasileiro em 2009 e 2010.

O Banco Morgan Stanley prevê que este ano nosso PIB vai cair 4,5% e que ainda cairá mais 0,5% no ano que vem. Enquanto isso o Bank of America/ML prevê que o PIB vai crescer apenas 0,8% este ano, voltando a crescer 4,4% no ano que vem. Ainda teríamos algumas dezenas de firmas com diferentes previsões para preencher a lacuna entre os dois acima.

Sabemos então que a previsão é frágil, pois sempre será um exercício de futurologia, com mais ou menos chances de confirmar-se. Então o mais importante é analisar como estamos passando pela situação atual, no caso uma crise épica e centenária que por hora devastou a economia mundial.

Nesse sentido o Dionísio está certo, pois vive me dizendo que um país como o Brasil, que tem a terceira maior fabricante de aeronaves do mundo; tem a segunda maior mineradora do mundo; tem uma empresa de petróleo com tecnologia de ponta e reservas de óleo que farão o país estar entre os oito maiores produtores nos próximos dez anos; um país com um mercado consumidor de quase 200 milhões de pessoas; um território e uma indústria de alimentos que fornece mais comida do que o brasileiro poderia consumir; o único entre os iguais que possui uma taxa de juros ainda muito elevada e que portanto permite uma queda acentuada que estimulará o consumo e a atividade econômica, não pode estar mal preparado para o futuro.

Enfim, como disse em uma entrevista para o Wall Street Journal essa semana Jim O’Neill, o criador do conceito “BRIC”, nome para o grupo de países que segundo o economista da Goldman Sachs irão ser os pilares da economia global em 2050:

O´Neill: “Argumentei durante três anos que não seria possível realmente dizer se Rússia e Brasil justificariam seu status de Bric até que passassem por um períodos de preços de commodities fracos.”

WSJ: Então este é um teste maior para Brasil e Rússia do que para Índia e China?

O´Neill: “Este não é nenhum teste para China e Índia. É decididamente um teste para Rússia e Brasil. E é um bom teste.”

WSJ: Eles passarão?

O´Neill: “Acho que a evidência no Brasil já é sim. A estrutura macroeconômica de melhores práticas que Lula adotou sete anos atrás está demonstrando que o Brasil pode lidar com essa crise. O Brasil dos anos 70 aos 90 estaria tão ruim quanto à Rússia. Não estou certo de que a Rússia possa enfrentá-la e temo que não possa. Até agora, esta crise está demonstrando que a Rússia é dependente demais de commodities.”

WSJ: Quando o Sr. fala sobre o Brasil conseguindo enfrentar, o que quer dizer?

O´Neill: “A moeda enfraqueceu, o mercado acionário enfraqueceu, mas diferentemente de crises brasileiras passadas eles não tiveram de aumentar as taxas de juros para conter a saída de capital, o que é um sinal muito poderoso.” (fim do trecho)

Deixemos as previsões para os economistas que, aliás, são muito bem pagos para fazê-las. Assim como o Dionísio, muitos aprenderam a andar com um guarda-chuva ao sair de casa independente do que a previsão do tempo diz.
Espero que aqui possamos sempre “discutir” e fazer uma avaliação sincera, realista das condições econômicas do presente e das conseqüentes oportunidades que nosso país continuará a apresentar para os que souberem aproveitá-las.

quinta-feira, 5 de março de 2009

O mundo e seus insistentes movimentos pendulares

Nos momentos atuais cada um de nós tem dedicado um pouco mais de atenção aos acontecimentos econômicos mundiais, enquanto ao mesmo tempo nossas mentes têm procurado por respostas sobre quanto essa crise significará de perdas para a economia real e por quanto tempo a teremos por aqui.

Não é de surpreender também que surjam nesses momentos muitas previsões sobre o futuro, sejam de economistas ou de videntes, e especialmente muitos cavaleiros que insistem em serem os arautos do apocalipse. A pergunta que não nos deixa em paz ao acompanhar essa inundação de dados e notícias fica sem resposta enquanto ficarmos apenas analisando os fatos presentes sem a perspectiva das engrenagens que movem o mundo capitalista.

Recordei-me de minha visita à ilha de Cuba há alguns anos atrás e de como achei retrógrada a entrevista da imigração deles, questionando-me se eu tinha algum vínculo político ou ainda que tipo de atividade social eu praticava no Brasil, como se eles ainda estivessem na época da guerra fria. Na verdade, afora a parte triste de existir um lugar como aquele, com pessoas que não têm a perspectiva do que é viver outra vida senão sob o jugo da mão ditatorial, eu entendi ao passar pela imigração que a partir daquele momento eu precisava olhar as coisas sob a lente do entendimento das engrenagens que moviam aquele regime e a vida dos habitantes do lugar. A viagem foi a partir de então, fantástica.

Aconselho uma visita. A parte histórica de Havana parece uma visita às cidades antigas da Europa; a região de Varadero, a praia com muitos hotéis à uma hora de Havana, é linda, com a mesma água azul turquesa que eu vi em Bahamas, mas com a vantagem de uma área enorme de areias brancas; o serviço é muito bom para um lugar que não tem luxos; a comida é muito parecida com a nossa e muito saborosa. Mas aconselho uma visita para antes de o regime ruir, pois depois a ilha vai receber tanto investimento que vai virar um balneário para os norte-americanos, que finalmente vão levar alguma dignidade econômica para os cubanos, embora me preocupe muito se vai sobrar algum charuto cubano para o resto do mundo comprar quando tudo isso acontecer.

Sem querer tirar o prazer da viagem mental que fizemos à ilha de Cuba, trarei nossos pensamentos de volta para o assunto “crise” e aquela pergunta que não quer calar. Por enquanto não posso oferecer mais do uma reflexão sensata sobre as observações que faço diariamente, no caso de hoje, sobre alguns dados interessantes que uma consultoria de Londres publicou essa semana.

Uma das engrenagens que movem o capitalismo é a precificação de um ativo pela lei da oferta e procura. Pelo que temos visto, a oferta de ativos financeiros tem sido maior do que a procura e por isso os preços mantêm-se em baixa, especialmente o petróleo. Recordem que apesar dos esforços feitos, a matriz energética do mundo ainda está casada com o “ouro negro” e assim permanecerá por muitos e muitos anos, especialmente se o preço dessa fonte energética permanecer em patamares acessíveis. O que aconteceu nos últimos cinco anos foi icônico nesse sentido, quando o preço do barril de petróleo explodiu dos 38 dólares por barril em 2004 para os 150 dólares do ano passado.

Tamanha é a importância do preço do petróleo para a economia mundial que mesmo os países que lucram com a exportação desse elemento estavam muito preocupados com o desequilíbrio causado nas contas de indivíduos e governos com tal abuso praticado pelos players do mercado futuro de petróleo, responsáveis por incendiar a tendência real que havia de alta nos preços, reflexo do crescimento mundial pujante que acontecia.

Os números indicam que o mundo gastou em 2008 o equivalente a 4,9% do PIB mundial com petróleo. Sinceramente, esse número sozinho não diz nada, mas se comparado com a projeção dessa mesma consultoria de que em 2009, em consequência dos preços baixos praticados atualmente, esse gasto será de “apenas” 2% da riqueza gerada no mundo inteiro, significa que nós todos em conjunto economizaremos 1,72 trilhões de dólares só nesse item. Não foi levada em conta a economia em cascata que os preços mais baixos dos combustíveis vão causar na cadeia produtiva como um todo, o que certamente vai significar uma poupança adicional.

Esse valor que será poupado por todos nós é equivalente, de acordo com os cálculos feitos pelos mesmos consultores, a quase três vezes os pacotes de incentivos econômicos anunciados para serem “queimados” ainda este ano, no mundo inteiro. É como se uma força oculta declarasse agora um pacote de estímulos desse porte gigantesco, oferecendo sem distinção de raça, credo ou cor (excetuando-se um outro ditador disfarçado de democrata que infesta um país vizinho e produtor de petróleo), uma benesse para todos os agentes econômicos, nós consumidores inclusos. Posso pedir que você releia as linhas acima novamente, por favor? Obrigado.

O quanto esse “pacote” ajudará a economia mundial a voltar a crescer e em que velocidade, está além de minha capacidade como gestor. Mais uma vez deixo essa tarefa para os que lidam com futurologia, coisa que não faço.

As engrenagens do capitalismo continuam a ditar os altos e baixos da economia, fazendo os pêndulos que ditam a intensidade dos movimentos financeiros serem ao mesmo tempo “vilões e mocinhos” de nossa vida econômica.

O que me parece, ao observar esse caso do petróleo, é que como se fosse uma Lei, para cada movimento que gere um desequilíbrio, há uma força de magnitude similar que impele o pêndulo na direção oposta, assim como em todos os demais aspectos da vida em que podemos comprovar isso, oferecendo em cada ponto extremo de seu curso a clara sensação de que exageramos e que não poderemos evitar a correção, que eu meu entender, é sempre bem-vinda.

sábado, 21 de fevereiro de 2009

O Sarney, você, eu e a deflação

Por favor, levante a mão quem foi “Fiscal do Sarney” em 1986!

Vamos lá, não precisa ter vergonha. Dá uma olhadinha pro lado agora, não tem ninguém te olhando, ou se tiver, não deve estar lendo esse mesmo Blog. Se for o caso, azar, mas não deixa isso te inibir não! Se você, assim como eu, achou que aquele Plano Cruzado era uma maravilha e merecia que nós vestíssemos a camisa de fiscais do Sarney a cada visita que fizéssemos ao supermercado, parabéns e levante a mão com orgulho de quem é defensor do justo e do correto! Muito bem, pode baixar agora.

Bom, pelo menos eu tenho a desculpa de que só tinha quinze anos na época e não tinha a consequente consciência do que fazia. No seu caso, espero que realmente ninguém tenha visto seu gesto.

Se por um lado esse e outros episódios ficaram como engraçadas passagens da história de um país que não mais existe tal como era, uma coisa eu aprendi desde então e faço coro com qualquer ex-fiscal do Sarney: é a de que a inflação é um monstro que precisa ser controlado e enjaulado, com o risco de ao não fazê-lo, ver a pior das consequências para a economia e para o povo de um país.

O que pode surpreender qualquer um atualmente é ler a respeito do perigo que representa a queda de preços, do perigo do oposto da inflação, a deflação. Fala sério, me sinto enganado por todos esses anos que acreditei ser a inflação um mal que precisava ser combatido e agora os economistas vêm nos dizer que a inflação é necessária e é um bem para a economia se for bem controlada? Isso pode fazer sentido? Vamos ver em mais detalhes qual o perigo quando acontece o inverso.

Economicamente falando, deflação é uma queda persistente e generalizada no nível de preços de bens e serviços de uma economia, isso acontecendo quando a taxa de inflação já está abaixo de zero, ou seja, a taxa fica negativa. A causa normal dessa condição é um desequilíbrio na relação entre a oferta e a demanda, notadamente a falta de demanda para a oferta total de bens e serviços disponíveis.

Uma coisa é uma queda nos níveis de preços dos bens e serviços por um período, o que podemos chamar de “desinflação”, pois enquanto esse movimento diminui a taxa de inflação, a mesma ainda permanece positiva nesse mesmo período, por exemplo, em um ano calendário.

No meu entendimento, o verdadeiro perigo desse processo de persistente queda de preços mesmo após a inflação chegar ao zero, a deflação, é a grande chance de se formar uma condição de contínua queda dos preços e o consequente afundamento da atividade econômica, pois a deflação apresenta, como mencionado anteriormente, uma sobra de bens e serviços que não encontra compradores, fazendo com que esses “bens” sejam ofertados com menores preços em uma espiral deflacionária muito perigosa.

Esse processo de queda de preços não seria de todo o mau se não entrasse na tal espiral, pelo fato de que nos períodos longos de deflação, muitos decidem esperar mais tempo para comprar algo, contando com que o preço seja ainda menor no futuro, o que acaba por gerar uma sobra ainda maior de “bens” sem compradores e a consequente oferta desses “bens” a preços ainda menores, e aí as pessoas decidem por continuar esperando, as empresas param de investir, os investimentos que deixam de ser feitos deixam de gerar empregos e salários, o desemprego afeta o consumo, e então você já sabe o que acontece e já entendeu a espiral deflacionária que acaba por destruir a economia como um todo.

Não, não quero que você se sinta em um filme de terror e espero que ao ler o parágrafo acima, eu não tenha feito você segurar a respiração. Aliás, não tenho gosto por filmes ou livros que me façam sair da apresentação pior do que entrei. Penso inclusive que fazemos um favor para a sanidade de nossas mentes quando não submetemos as mesmas ao peso que os pensamentos desse gênero de filmes geralmente apresentam. Quem não se sente cansado e até aliviado quando acaba um filme desses?

Pois é, entendo que já temos que enfrentar tantas lutas na vida real que o melhor é brindar a mente com idéias luminosas, agradáveis, e se possível, que nos façam elevar os pensamentos para os aspectos mais importantes de nossas vidas, e não o contrário. Mas isso é outro, e agradável assunto. Voltemos ao tópico do dia.

Não preciso dizer o que você já sabe, ou seja, que esperamos de nossos governantes mundiais mais do que palavras de encorajamento e otimismo, pois essas sem o respaldo de muita ação inteligente, não resolvem nada. Ao mesmo tempo penso ser prudente recordar a cada um de nossos leitores sobre a responsabilidade e o poder que temos quando atuamos em conjunto na sociedade em que vivemos. Espero que cada um possa refletir sobre o momento especial que vivemos e que momentos assim exigem, ainda que já o façamos normalmente, mais atenção ao todo do que apenas à realidade pessoal de cada um.

Sejamos prudentes com os gastos, sejamos inteligentes para escolher quais ofertas comprar, sejamos rápidos para aproveitar os desequilíbrios na oferta e demanda, mas, pense que para o bem comum, todos precisam continuar em seus negócios, senão, como dizia um simpático senhor de uma fazenda que uma vez visitei: “Se você apertar demais as tetas da vaca, amanhã não vai conseguir tirar o leite!”

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

"Terra à vista!" (com outro sotaque)

− O epicentro para as Américas precisa ser um país como o Brasil, que é o país emergente mais promissor da região.

Esse dizer acima poderia ter sido pronunciado por um governante português no século 16.

Quem nunca se lamentou de não estar presente pra ver a maravilha que encontraram aqui os portugueses quando Cabral foi enviado para tomar posse das terras a leste de Tordesilhas?

Eu queria estar presente, não pra viver as dificuldades que a vida da época devia apresentar, mas para sentir a alegria de descobrir uma terra tão próspera, tão bonita e com a maior das virtudes, a prerrogativa de tornar-se uma nação próspera e de paz como a que queremos ver realidade, e que não tenho dúvidas de estarmos a caminho de alcançar um dia.

Temos lido na mídia e eu tenho publicado minha opinião sobre diversos aspectos da crise mundial e das consequências para nossa realidade verde e amarela. Mais do que isso, os leitores são empresários, executivos, profissionais liberais e estudantes que estão em contato direto com a realidade da economia real, sendo importantes atores na condução da mesma.

Sobre essa condução, imagino que alguém possa ler e considerar um exagero minha afirmação de que são todos importantes atores na cabine de comando dessa grande nau (dessa vez não é a portuguesa). Se assim parece, peço que considere a real face da economia e dos mercados. Quem a determina? Quem tem peso na balança que marca o valor de nossas conquistas como país, como uma nação?

Excluindo o contingente que não tem ainda a condição para ser mais do que figurantes nessa cena, preenchendo a tela com sua mão-de-obra abundante e ainda feliz por ter essa chance, me refiro ao poder que temos como consumidores, como poupadores, tomadores de crédito e principalmente como empreendedores.

Essa condição não é exclusiva dos grandes empresários, pelo contrário, muitos têm a iniciativa e desenvolvem suas idéias, seus anelos e sonhos no campo profissional, aliando a inteligência ao esforço e aproveitando que somos uma nação regada pela generosidade da natureza e com um imenso mercado consumidor.

Acaso esquecemos o significado que tem o Brasil para os demais países do continente? São Paulo ser a maior cidade do hemisfério sul do planeta não significa nada além do caos no trânsito? Não vou listar os mega números que explicitam a importância do que fazemos aqui já que eles estão constantemente nos jornais. Não é por acaso que nossa economia real recebeu mais de 40 bilhões de dólares em investimentos vindo do exterior no ano de 2008. Imaginem se não tivéssemos a crise a partir do meio do ano passado, o quanto mais teria sido investido no último trimestre.

Se você, assim como eu, está cansado dessa promessa que ainda não se cumpriu, respire fundo e mais uma vez deixe para trás as difíceis relações que cada um de nós tem com o governo e com nossa confusa legislação. Não volte a se irritar pensando na parte de nossos políticos que merecia estar em uma cadeia. Concentre-se novamente na sua realização pessoal e profissional e no que isso colaborou com muitos outros, com o país.

Nós temos construído o Brasil que queremos ser. Nós temos ditado para os governantes quais os limites em que a caneta do governo pode sentir-se solta para suas idéias próprias e qual a fronteira que não pode ser ultrapassada, pois essa linha delimita a área em que a economia real é a que manda, é o terreno que pertence ao povo que faz e acontece diariamente nesse país. Se não fosse assim, seríamos mais um desses países que estão nos jornais quase todo dia, infelizmente pelos absurdos que falam e fazem os governantes. Países onde a dependência de uma principal fonte de riqueza acaba por permitir o surgimento de um tirano. Nesse caso específico é uma pena ver um país ser afundado pelo seu governante. Imagino a aflição desses povos que não conseguem ver saída pacífica para libertar-se dessa influência terrível. Mas estaremos colaborando para mudar isso se continuarmos a ser um exemplo da força oriunda do empreendedorismo.

O Brasil esteve moribundo durante algumas décadas antes do plano que trouxe a estabilização da moeda e o controle da inflação. Era fácil observar a liberdade que tinha cada novo governo para tentar planos mirabolantes ou velhos planos que em outros países já haviam sido experimentados e reprovados. A caneta que assinava a ordem presidencial era muito mais forte do que a voz da economia real.

Não demorou muito tempo, prova do poder que emana da economia, para que o Brasil estivesse em um rumo firme, tentando entender o que precisava fazer para aumentar a velocidade de cruzeiro. Menos de dez anos nessa nova condição e tivemos o teste definitivo: a ascensão ao poder de um político que passara os vinte anos anteriores fazendo juras de revolução e ódio ao sistema capitalista vigente. Previram-se todas as desgraças possíveis, imaginamos que tão logo assumisse o poder, sua caneta presidencial assinaria a sentença de morte de nossa economia e levaria a nação ao caos.

Até hoje ainda me surpreendo, e sei que você leitor também, com a força que deve ter sido aplicada pela nossa realidade econômica em cima do presidente que era tido quase como um louco, a ponto de ele não apenas ter mantido como ainda ampliado a rota de políticas econômicas e de responsabilidade que o antecessor havia adotado. Ver a ira que isso causou nos correligionários do seu partido foi quase como um bálsamo cicatrizante para meus olhos ainda ardidos com a novidade. Mas de acordo com a lei do mais forte, a realidade prevaleceu.

Se com esse passado que conhecemos e ainda com o que já esquecemos, chegamos até aqui, não precisa ser guru para prever com boa possibilidade de acerto que, afora o soluço inerente à crise global, caminhamos para consolidar o lugar que já estamos marcando nesse mundo globalizado. O Brasil desponta, apesar de todos os problemas, como um país que terá a cada dia mais influência econômica e talvez política no mundo. Os sinais são muitos, olha abaixo essa notícia cuja fonte é a Bloomberg Press de 29 de janeiro último.

O Standard Bank, maior banco da África do Sul, pequeno se comparado aos nossos gigantes Itaú e Bradesco, mas ainda assim, com um valor de mercado maior que 15 bilhões de dólares americanos, anunciou a mudança de seu quartel-general para as Américas, que até hoje era em NY e agora passa a ser SP. O banco já conta com mais de 100 funcionários no Brasil e planeja contratar mais ainda este ano. Eles estão formando um fundo de USD 250 milhões na modalidade “private equity” para investir no país.

Interessante mesmo é o que os motivou para a mudança da sede dos EUA para o Brasil. De acordo com o presidente regional, o motivo foi que:

− O epicentro para as Américas precisa ser um país como o Brasil, que é o país emergente mais promissor da região.

Pois é, quem diria que Cabral era um visionário? E você, vai ficar lamentando a metade vazia do copo ou vai saborear a metade cheia?

sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

Sobre o "erro crasso"

Conheci muitas pessoas, incluindo a mim mesmo, que em determinado momento da vida fizeram uma ou mais daquelas bobagens que a razão julga tardiamente como erro ingênuo, tosco ou primário.

Por exemplo, quando na primeira viagem aos Estados Unidos eu dava com a cara no vidro toda vez que puxava uma porta com o intuito de abri-la, apenas porque a mente não conseguia se acostumar com o ato de empurrar ao ler a palavra “PUSH”. Tá bom, talvez o exemplo seja ingênuo demais.

Que tal então aquela corridinha para entrar no elevador embora a porta esteja começando a fechar, mas a gente sempre acha que vai dar e acaba ficando com aquele sorriso amarelo no intuito de passar a impressão que não doeu nada, que mal sujou de graxa a camisa quando as portas fizeram sanduíche de você? Ainda é um exemplo simples, mas se você riu, bem-vindo ao clube dos que já passaram por esse “aperto”.

Agora ao exemplo atual e revestido de interesses financeiros. Não vi apenas um, vi vários conhecidos, que ao longo dos últimos meses permitiram-se acreditar que tudo o que vinham compreendendo e consagrando como certo no mercado de capitais estava, do dia para a noite, errado. Era como se a ciência que trata da oceanografia tivesse que ser totalmente reescrita após a passagem daquele tsunami que varreu o Oceano Índico anos atrás, ao invés de ter esse fenômeno estudado e acrescentado ao vasto cabedal daquele ramo do conhecimento.

O que parece óbvio não é a resposta universal para todas as perguntas. O fato de que muitos estavam vendendo quaisquer ações e outros ativos financeiros a qualquer preço não indicava um comportamento racional ou premeditado. Ao contrário, sabemos que parte disso respondeu principalmente à necessidade de gerar liquidez (dinheiro) no menor prazo possível. A outra parte foi por conta do pânico mesmo.

Observei algumas pessoas que por conta do que os jornais retratavam para aquele mês ou período, projetaram aquela “foto” como válida para toda a vida e assim se portaram com seus investimentos, vendendo barato o que haviam comprado quando estavam “certos” de seu valor futuro.

Um pouco de história e conhecimento, de acordo com inúmeras fontes que consultei, pode nos ensinar muito. Você descobrirá que conhece algo sobre uma época romana, ou pelo menos, refere-se a uma passagem de sua história com freqüência, ou você nunca disse: “isso foi um erro crasso”. O mais surpreendente é que se sabe muito sobre esse fulano que deu origem à expressão citada acima.

Eu li que em 59 A.C, o poder em Roma foi dividido entre Júlio César, Pompeu Magnus e Marco Licinius Crasso. Este último era mais conhecido pela sua riqueza do que por seu talento militar. Júlio César conquistou a Gália, Pompeu dominou a Hispânia e Jerusalém. Crasso precisava mostrar sua teórica inteligência militar e decidiu que como prova de tal inexistente aptidão conquistaria os Partos, um povo persa cujo império ocupava, na época, boa parte do Oriente Médio.

Comandante de sete legiões romanas, famosas desde sempre pela dedicação em batalha e temidas em todas as partes do mundo de então, Crasso confiou demais na superioridade numérica de suas tropas. Abandonando as táticas militares romanas, ignorando as lições aprendidas em séculos, deu ordem para que os 50 mil legionários avançassem por um estreito vale que provia nenhuma vantagem militar, pelo menos não para quem decidisse se espremer nele. Na ânsia de chegar logo ao inimigo decidiu a sorte da batalha.

Os orientais fizeram como eu sempre fazia quando jogava “WAR”, concentraram suas tropas nas saídas do vale, no ponto onde podiam oferecer muito poder de fogo contra uma parte pequena do inimigo que avançava.

Ocorreu o óbvio, o exército romano foi dizimado. Consta que quase todos os 50 mil soldados morreram, incluindo o “exímio general” Crasso.

Tamanho erro feito por Crasso virou, em várias línguas, sinônimo de estupidez.

Continuando, nas últimas semanas começam a despontar no horizonte ainda distante a leste, os primeiros sinais de que após a tempestade o céu tende a se acalmar, e que eventualmente, no tempo certo até veremos o azul celeste, afinal, os processos do universo sofrem o impacto de muitas “imprevisibilidades”, mas como tudo que existe nele, os elementos se adaptam e reiniciam seus movimentos habituais e naturais.

O caminho fácil é deixar-se seduzir pelas imagens que os outros nos apresentam. O difícil é manter-se isento e praticar o superior ato de pensar por si mesmo, maneira pela qual, muitas mentes conseguem atingir objetivos que aos olhos dos demais parecem extremamente difíceis.

Foi um erro crasso praticado por aqueles que deixaram levar-se pelo pânico, rasgar o conhecimento acumulado durante anos no mercado de capitais simplesmente porque parecia muito mais fácil do que se colocar a pensar sobre o que de fato estava acontecendo. Tenho um amigo que se lamenta disso todo o dia, vendo o mercado recuperar um considerável trecho do terreno perdido embora ele não tenha mais as ações em carteira.

Ninguém pode dizer quanto tempo levará para a economia mundial recuperar-se, mas nem por isso precisamos ignorar os conhecimentos básicos que determinam o ir e vir da economia real, onde a riqueza é criada e onde estão as maiores oportunidades de investimento.

domingo, 25 de janeiro de 2009

O Amaro, Obama e a maquininha de fazer dinheiro

A impressão que temos ao ler os jornais dos últimos meses, com os anúncios de governos no mundo inteiro preparando planos de combate à crise, poderia ser a de que ninguém sabe se a crise será maior ou menor do que a disposição e dinheiro dos que a combatem, ou ainda mais intrigante, onde é que esses governos vão achar tanto dinheiro para irrigar as economias desses países nos montantes anunciados.

Com esse ar intrigante me ligou o Amaro, amigo de longa data, companheiro nos momentos felizes e nos tristes, daqueles que sempre dá pra gente se divertir mesmo quando falamos das coisas mais difíceis da vida.

A dúvida em sua mente era exatamente como poderiam esses governos lançar tais pacotes. Incomodava-o acreditar que nossos primos do norte poderiam lançar pacotes que somam alguns trilhões de dólares americanos.

A conversa desenvolveu-se mais ou menos assim:

− Oi, tudo bem? Tô preocupado com essas notícias sobre os pacotes contra a crise! − abriu a sessão o Amaro.

− Amaro, o quê exatamente te preocupa, a crise ou o pacote de resgate que os americanos anunciaram?

− Esse dinheiro todo que eles tão falando nos jornais. Os caras têm toda essa dinheirama?

− Não, não tem, mas é fácil de ter. Sabe a máquina de verdinhas? – perguntei me referindo às máquinas que imprimem dinheiro e que só têm esse nome porque como todos sabem lá as cédulas são monocromáticas em tom verde.

− Que maquininha verde? Do quê você tá falando? – esbaforiu ele com aquele ar de quem está metade assustado e metade perdido.

Respirei fundo sabendo que a resposta precisava não apenas de informação, mas de bastante paciência para frear aquele estado de confusão e medo na mente do Amaro, e mudei a tática:

− Amaro, o dinheiro que um país dispõe para gastar ou investir é aquele oriundo dos impostos arrecadados e mais a capacidade de endividar-se, que por sua vez é diretamente proporcional à confiança que o público “emprestador” tem nesse país. No caso americano (do norte), afora a gigantesca arrecadação governamental, o país é considerado como o de menor risco existente no planeta, na prática, tido como risco zero. Então a resposta é que eles têm o dinheiro que precisarem, é só mandar a casa da moeda imprimir mais.

− Mas como assim? E pode isso, não tem limite? – continuou descrente.

− Sim, tem limite, mas esse limite é elástico. O Brasil, por exemplo, que não tem tal nível de credibilidade – continuei – tem uma dívida pública que corresponde a 37% do PIB e ainda temos que gerar uma sobra de arrecadação que é utilizada para diminuir essa relação a cada ano. Essa diminuição é necessária principalmente porque temos taxa de juro muito alta, gerando um enorme custo de “serviço da dívida” (o que se gasta em juros e correções do principal).

− Então, os caras vão conviver com um déficit enorme nesses próximos anos, isso não vai quebrar as contas públicas deles? – era a última tentativa que ele fazia para sustentar aquela posição de desconfiança.

A explicação que dei para tal possibilidade de gerar mais dívidas é a de que o sistema vigente permite tais regalias, pois se sustenta na credibilidade e não em produtos ou bens, ou ainda em reservas de metais preciosos como eram usadas antigamente. Em suma, o atual é um sistema que vive na perigosa linha do equilíbrio psicológico mútuo, ou em casos de crise como agora, na linha de frente da guerra psicológica.

Diferente do Brasil, existe uma condição propícia para os Estados Unidos da América gerar tal aumento no déficit orçamentário, pois inversamente ao nosso caso, o custo de rolar uma dívida lá é baixíssimo se comparado ao nosso. É a mesma coisa de tomar dinheiro emprestado com um amigo e pagar corrigido ao CDI ao invés de ficar estourado no cheque especial, ou seja, um abismo separa ambos.

− Você tá mesmo otimista com tudo isso, não tá vendo a verdade! – sentenciou o Amaro.

Em alguns segundos fiz uma recordação mental dos últimos seis meses de crise e acontecimentos globais, e então respondi:

− Amaro, eles vão ter todo o dinheiro que julgarem necessário. O PIB deles é algo como USD 14 trilhões (o nosso deve estar em torno de BRL 3 tri). Eles vão subir o endividamento público do país em mais USD 1.2 tri de dólares. Possivelmente vão rodar uns dois ou três anos nesse nível enquanto a economia prepara para retomar o crescimento que apresentava, para então parar de aumentar o furo e eventualmente diminuí-lo.

Falei ainda sobre a ascensão do Obama ao poder e tudo o que representava isso para aquele país e para o mundo. Manifestei-lhe que a julgar pelo que conhecemos até agora, o novo presidente pode ser a pessoa certa para reconduzir a economia mundial ao ponto em que eles mesmos se perderam anteriormente. Mas essa parte caiu no vazio.

Julguei ser prudente não mencionar que o Brasil é atualmente o 6º maior credor do Tesouro americano na categoria “estrangeiros”, incluídos nessa lista alguns gigantes como China, Japão e etc. Nós possuindo mais de USD 140 bilhões em títulos daquele emissor.

Mas já era o final da conversa. Não sei se foram os números que o deixaram meio assombrado ou se eu havia despertado nele a nobre virtude da humildade que aflora quando nos vemos frente algo muito maior que nossas forças ou do que nossa compreensão.

Não me lembro o que ele disse antes de desligar, mas fiquei com a sensação de que ele não estava mais preocupado de onde sairão as montanhas de dinheiro que serão injetadas na economia mundial. Devia estar pensando na próxima preocupação da lista.

Talvez cada um de nós, assim como o Amaro, tenha sentido um dia um choque de realidade ao descobrir que o dinheiro que nasce na economia e que é poupado por cada cidadão ou governo, acaba sendo o mesmo que financia o déficit daqueles que gastam mais do que arrecadam. Ao mesmo tempo, os que gastam mais acabam gerando mais riqueza global, que por sua vez, na parcela que não é destinada aos gastos e investimentos, reflete-se na compra de mais títulos de dívida (poupança), e o ciclo se repete indeterminadamente.

Acho que o Amaro fez as pazes com o Obama. Não me surpreenderei se ele sonhar com a maquininha verde.

Então, o que será de todos nós? Ora, ao trabalho como sempre fizemos, pois o ciclo continua e de acordo com o resultado parcial da enquete ao lado, ainda vamos rir muito de tudo isso.